quarta-feira, 12 de agosto de 2009

Do mel e do féu...


Ana não sabia andar na linha. A única linha que conhecia era do seu corpo e da meada dos seus desejos. Nenhuma linha finita interessava, porque Ana é infinda no que sente, no que vive e no que a faz tremer. Porque nada que não tivesse gosto de mel e féu simultâneamente a interessava.

Andou uma época, é bem verdade, procurando sua paz. De fato, empenhou esforços nessa decisão. E enfim, a encontrou. Paz. Mas o fato é que desde então tinha de volta suas noites de sono, dormia tão profundo que anestesiava. E Ana não gostava das noites bem dormidas. O que lhe aguçava mesmo os sentidos era ir e vir entre uma lua e outra.

Aquela paz era tão morna, que Ana mal suportava. Descobriu, então, que gostava de viver entre vulcões. No calor da lava que lava a alma. Porque não era puta, tampouco se assemelhava a qualquer santidade. Mas gostava de sentir a iminência do queimar.

Olhava para a porta e aquela paz a sufocava. Quase como um ato de desespero, Ana pegou sua bolsa e o dinheiro que havia em cima da mesa. Calçou o seu habitual salto doze, se maquiou de urgência, de paixão.

E ali encontrara sua paz. Bem ali, no turbilhão do que se sentia. Nas possibilidades que se escancaravam no exato momento em que batera a porta e saíra. E dessa vez, sem hora para voltar.

segunda-feira, 3 de agosto de 2009

Da falta de ausências...


Nunca sofri de ausência. Ausência de afeto, ausência de amor, ausência fraterna. Jamais as palavras deixaram de caminhar ao meu lado, como companheiras e cúmplices de uma história que conto em tom vermelho vívido.

Nunca sofri da ausência de sentidos. E hoje, mais do que ontem, sinto. Sinto o calor do homem amado, do abraço apertado, das nossas horas. Sinto uma completude que enobrece a alma e enriquece uma trajetória temperada de cardamomo.

Sinto-me completa de alegrias que ainda estão por vir. De um prenúncio que embala meu ventre e que dança pelas minhas curvas. Da dança da vida, tão rica. Do hoje, do amanhã, do sempre. Do ciclo encerrado, do abraço apertado, de você ao meu lado. Porque tudo começa e se encerra na minha vontade de ser.

De ser um pouco diva, um pouco amiga, um pouco amante. De ser aquilo que me cabe, que me sacia, que me torna viva. Porque só quem conjuga o verbo sentir, vive. Só quem sente transborda. Não que a razão não seja fiel escudeira, mas, mesmo ela sente.

Das palavras que pari, nenhuma delas me apetece mais do que amor. Amor de entrega ao que, e a quem se ama. Daquele que caminha junto, que vibra. Da poesia que vejo na roda viva, vida, fugaz.

Da poesia que carrego no sobrenome. Carlos Drummond Andrade, Mário de Andrade, Eugenio de Andrade, Luciana Andrade. De tudo que quero e se quero, posso. Nada me estanca, porque flui como cachoeira.

Do que se sente e fim.